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Caio, logo existo. Mário Novello, Cosmos e Contexto, 2012
O programa de TV a cabo, da Globo News, Espaço Aberto – Ciência e Tecnologia exibiu, no dia 08 de agosto de 2011, uma entrevista com o ex-astronauta Eugene Cernan, da Apolo 17. Os entrevistadores foram três meninos e uma menina e a entrevista durou pouco mais de 20 minutos. A missão Apolo 17 foi a última a levar astronautas à superfície da Lua. A missão durou 3 dias na Lua, e ocorreu em dezembro de 1972, há quase 40 anos. (A entrevista pode ser vista aqui.)
Um dos meninos entrevistadores, Daniel Turela Rodrigues (14 anos), fez a seguinte pergunta: “— Como foi o momento em que o Sr. caiu na Lua, levou um tombo?”
Eugene Cernan comentou que o peso de qualquer coisa na Lua é 1/6 do peso na Terra, e isto facilitava os saltos na sua superfície. Então, a maneira mais eficiente de se movimentar era dando pulinhos, como coelhos. Por outro lado, quando havia a necessidade de se parar, ou de se fazer uma curva, a dificuldade era grande e muitas vezes eles sofriam pequenas quedas.
Os tombos na Lua colocam em evidência três leis importantíssimas da mecânica newtoniana: lei da gravitação universal, 1a e 2a leis do movimento. A lei da gravitação universal explica porque o peso na superfície da Lua é igual a um sexto do peso na superfície da Terra. Com o auxílio desta lei, podemos expressar matematicamente esta afirmação escrevendo
onde os M's representam as massas (7,349×1022 kg e 5,9736×1024 kg) e os Rs representam os raios (1.737,4 km e 6.378,1 km) da Lua e da Terra, respectivamente.
A 1a lei é a famosa lei da inércia, e ela diz que todo corpo permanece em repouso ou em movimento retilíneo uniforme desde que não hajam forças atuando sobre ele. Para mudar o estado de movimento, a 2a lei nos diz que é necessário uma força proporcional à mudança desejada — ou seja, à aceleração — multiplicada pela massa do corpo, que é uma medida de sua inércia. A inércia é a propriedade que todos os corpos têm de resistir a uma mudança em seu estado de repouso ou movimento.
Ora, o peso na Lua é 1/6 do peso na Terra mas a massa não muda! Em outras palavras, a inércia de um corpo não muda. E note que Eugene Cernan usava um equipamento de quase 100 kg! Somando tudo, ele “carregava” uma inércia de quase 180 kg! A sua própria massa — cerca de 80 kg — mais a massa de seu macacão e equipamento, que como foi dito era de quase 100 kg. Ao tentar parar ou fazer uma pequena curva ele precisava de ter força muscular para parar 180 kg, ou para fazer com que 180 kg de massa realizassem uma pequena curva! Acrescente-se a isto o fato de que a sua velocidade muitas vezes era grande e, portanto, a aceleração deveria ser grande também. A força necessária é igual a massa vezes aceleração, como vimos.
Qual é a melhor estratégia para não se cair? A massa não pode ser mudada, logo devemos mudar a aceleração. Eugene Cernan e seu companheiro deveriam parar lentamente, e fazer curvas de baixa velocidade (lembrar que as coisas ficam ainda mais complicadas numa curva, pois a aceleração é proporcional ao quadrado da velocidade).
O astronauta chamou também a atenção para o centro de gravidade alto, em relação ao chão, do conjunto astronauta, vestimenta e equipamento. Especialmente nas curvas, isto aumenta consideravelmente a instabilidade, provocando quedas. E podemos adicionar: as muitas irregularidades do terreno e a pouca flexibilidade da vestimenta e equipamento do astronauta. Todos estes fatores, mais o jogo implacável entre peso e massa (inércia), discutido acima, foram os causadores das inúmeras quedas na Lua.
Vamos apreciar agora os tombos lunares de Eugene Cernan e seu companheiro? Vejam aqui.
*Domingos Sávio de Lima Soares é físico, astrônomo e professor aposentado do departamento de física da UFMG.
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