domingo, 21 de abril de 2013

Medicina e física de partículas juntas na luta contra o câncer

Exame de PET revela na imagem acima um nódulo pulmonar ipsilateral. Fonte: http://www.itorax.com.br/ler.asp?codigo_categoria=22
Por Rafaela Coutinho* e Antônio Arapiraca** 

A medicina nuclear é uma especialidade médica relacionada à imagem, diagnóstico e terapia que nos permite observar o estado fisiológico de tecidos do corpo humano de uma forma minimamente invasiva, ou seja, é possível verificar o estado clínico de diversos órgãos sem a necessidade de procedimentos cirúrgicos dolorosos. Tal área é bastante desenvolvida atualmente e conta com centenas de exames e terapias disponíveis, tais como estudos do cérebro, diagnóstico e tratamento de tumores, análise funcional dos rins, entre outros.

Mas, como funciona a medicina nuclear?

Nesta especialidade o tratamento ou exame é feito através de fármacos denominados radiotraçadores, os quais são ingeridos em pequenas quantidades pelos pacientes. Estes fármacos tem na sua composição um tipo de elemento químico denominado isótopo radioativo, ou radionuclídeo, misturado com um determinado tipo de molécula orgânica. Nesta mistura, cada um dos componentes tem uma determinada função.

Os radionuclídeos tem a capacidade de emitir um tipo específico de radiação e podem emitir partículas beta, como elétrons e pósitrons, ou raios gama que posteriormente serão detectados através de um sistema eletrônico. Alguns elementos químicos utilizados como radionuclídeos são por exemplo o Gálio, Xenônio, Flúor, Iodo e Tecnécio e a escolha pelo uso de algum deles depende do exame ou da terapia. Já as moléculas orgânicas são empregadas a depender da região que vai ser estudada, pois cada tecido, órgão ou osso a ser tratado terá a tendência a absorver uma molécula específica.

Vale destacar que a quantidade desse material é cuidadosamente calculada a fim de garantir resultados precisos, limitando ao mesmo tempo a exposição do paciente à radiação, que é prejudicial à saúde quando absorvida em altas doses. Após a absorção, o paciente é dirigido á uma câmara especial, onde será feita a detecção da radiação resultante.

Neste artigo, para ilustrar o funcionamento da medicina nuclear, iremos focar em uma das técnicas mais utilizadas atualmente para o diagnóstico e monitoramento do câncer, a Tomografia por Emissão de Pósitrons – PET (do inglês Positron Emission Tomography). Para explicarmos um pouco mais sobre esse exame, precisamos explorar alguns conceitos sobre radioatividade e física de partículas.

Radioatividade em núcleos instáveis

Sabemos que todas as coisas existentes na natureza são constituídas de átomos. O núcleo atômico é formado por prótons (partículas de carga positiva) e nêutrons (partículas sem carga) e no entorno do núcleo temos os elétrons. Alguns elementos químicos possuem naturalmente o núcleo de seus átomos com excesso de energia. Para se estabilizarem precisam liberar parte desta energia e o fazem liberando partículas elementares subatômicas (partículas alfa(α) e beta(β)) ou radiação eletromagnética (raios gama). Este fenômeno de estabilização energética do núcleo atômico é denominado decaimento radioativo.

Representação artística do decaimento radioativo num núcleo atômico. Fonte: WikiMédia Commons.
As partículas alfa são na verdade constituídas de dois prótons e dois nêutrons e tem baixo poder de penetração quando atingem uma superfície. Já as partículas beta são muito mais leves, são mais velozes, tem um poder de penetração muito maior e podem ser elétrons (beta negativo) ou pósitrons (beta positivo). Os pósitrons em física de partículas elementares são a antipartícula do elétron, ou seja, tem a mesma massa e valor numérico de carga, porém são carregados positivamente. Os raios gama são fótons (partículas de luz) com altíssima energia, maior até do que a energia dos fótons utilizados em aparelhos de raios X e possuem grande poder de penetração, podendo inclusive atravessar todo o corpo humano. 

O exame PET e a aniquilação de pares

Equipamento típico de Tomografia PET. Foto: medialib.glogster.com/media/46 
O PET é um exame utilizado principalmente nas áreas de oncologia, cardiologia e neurologia que detecta alterações nas células e fornece informações acerca do estado funcional dos órgãos. Um radiotraçador que contém glicose (molécula orgânica) associada a um radionuclídeo (o isótopo radioativo Flúor 18 ) é injetado no paciente e irá se concentrar em regiões com excesso de metabolização da glicose, ou seja, como as células cancerígenas consomem muita energia e a glicose vai fornecer esta energia, o radiotraçador se concentrará no tumor. A grosso modo a glicose atua como uma isca para o tumor capturar o radiotraçador.

Quando em contato com as células cancerígenas o radiotraçador é absorvido e imediatamente os radionuclídeos sofrem decaimento radioativo dentro da célula emitindo pósitrons que interagem com os elétrons que estão próximos na célula. Quando um elétron (partícula) encontra um pósitron (antipartícula) acontece um fenômeno físico conhecido como aniquilação de pares onde o par elétron-pósitron é aniquilado e são produzidos dois raios gama com direções opostas.

Diagrama esquemático do processo de aniquilação de pares ocorrido quando a interação do par aelétron-pósitrons produz dois fótons gama. Foto: adaptado de WikiMedia Commons.
Este processo se repete para uma infinidade de interações entre elétrons e pósitrons e os raios gama resultantes viajam em direção a um detector que contém um cristal de cintilação, o qual transforma os mesmos em fótons de luz visível através do fenômeno da fluorescência (transformação das radiações absorvidas em luz visível, ou seja, com um comprimento de onda maior que o da radiação incidente). Em seguida, a luz visível será detectada por um tubo fotomultiplicador, convertendo luz em corrente elétrica (quanto maior for a quantidade de luz maior será a corrente elétrica). Finalmente a corrente elétrica chega a um computador e imagens tridimensionais serão reconstruídas digitalmente.

Esquema completo do processo de aquisição de dados e reconstrução de imagem de um equipamento PET. Foto: adaptado de WikiMedia Commons.
A imagem obtida através do PET não apresenta uma boa resolução nos fornecendo apenas a informação funcional de um determinado órgão, mas é possível unir a funcionalidade do PET às melhores resoluções anatômicas fornecidas pela técnica da Tomografia Computadorizada (do inglês Computed Tomography) em um equipamento conhecido como PET-CT.

Comparação das imagens obtidas com PET, CT e as duas técnicas em conjunto. Fonte: http://www.njironline.org/pet-ct-radiology-imaging-center-carlstadt-new-jersey.htm
Com isso podemos concluir que ao contrário do senso popular, a radioatividade pode ser benéfica quando utilizada de forma cautelosa e em pequenas quantidades para o diagnóstico precoce de tumores, que quando descobertos em fase inicial podem ter grandes chances de cura.

*Rafaela Coutinho é estudante do curso técnico em Equipamentos Biomédicos co CEFET/MG e colabora com fóton Blog.
** Antônio Arapiraca é físico, professor do CEFET/MG e editor do fóton Blog.

Referências utilizadas:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Medicina_nuclear
http://portaldaradiologia.com/?page_id=58
http://pt.wikipedia.org/wiki/Tomografia_por_emiss%C3%A3o_de_positr%C3%B5es
SILVA Márcio Melquíades. 2012. Equipamentos de Diagnóstico e Terapia por Imagem.

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