sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Uma brevíssima história da Astronomia – Da antiguidade até Newton


De Florestal/MG

Quero começar este texto propondo um experimento: imagine você em algum lugar do planeta Terra, no ano de 350 antes de Cristo aproximadamente (2360 anos atrás...). Você acorda, toma sua água, come seu alimento, e vai passear do lado de fora de sua casa (era um feriado e você não tinha que trabalhar). Daí, sendo uma pessoa bem inteligente, você se pergunta: “O Sol, aquela coisa quente lá em cima, todos os dias nasce daquele lado e se põe daquele outro lado. Por que isto acontece?”

Não tente imaginar a resposta com seu pensamento de hoje. Você não concorda que seria muito mais fácil pensar que a Terra está parada, e que o Sol (e demais astros) giram em torno de nós?

Agora vamos nos imaginar em um dia de serviço, não é mais feriado. Porém, você é um (ou uma) cientista daquela época. Antes de continuar, vou definir o que eu considero um (ou uma) cientista: é uma pessoa que estuda os fenômenos da natureza, procura descrevê-los matematicamente1 segundo uma teoria e/ou um modelo e esta teoria ou modelo tem que ser capaz de prever resultados futuros (dentro do limite de atuação de cada teoria ou modelo). Continuando... Sendo um(a) cientista você agora quer descrever como os astros (Sol, Mércurio, Lua, Marte, Júpiter, Vênus e estrelas) se movem em torno da Terra, pois esta é a observação feita a respeito da Natureza por você. Mas, para descrever matematicamente os fenômenos você precisa ou de ter a matemática a seu dispor, ou construir a matemática necessária, correto? E agora José?

Na antiguidade a matemática 'pouco' tinha se desenvolvido. Pouco está muito entre aspas, pois já existiam a escola Pitagórica, a escola Alexandrina, as escolas gregas em geral. A geometria Euclidiana já estava, pelo menos, bem fundamentada. Portanto, você vai tentar descrever o movimento dos astros de acordo com a geometria. Um objeto geométrico que era visto como um objeto perfeito é o círculo. Ao enxergar o Sol girando em torno da Terra, você pode tentar descrever o movimento dele em torno da Terra como o movimento circular. Daí, como cientista, você quer que a Natureza seja constante (o céu é imutável), que os fenômenos 'parecidos' tenham uma formulação matemática parecida. Você então diz que todos os planetas giram em círculos em torno da Terra!!! Maravilha. Com poucos erros, o movimento da Lua, do Sol, de Vênus e de Mercúrio estão muito bem descritos. Mas o movimento de Marte não2. :-(


Movimento retrógrado de Marte: seu movimento é observado no céu
em relação às estrelas fixas. Note que ele parece 'retornar' no céu, ou fazer um loop.

Qual o problema com sua descrição? O movimento circular é o mais perfeito, a Terra estar no centro do sistema solar (e do Universo) é uma descrição perfeita, a matemática está correta. Então você pensa bastante e conclui o seguinte: o movimento de Marte é um movimento circular em torno da Terra somado a um movimento circular em torno de sua própria órbita. Pronto!!! Problema resolvido. Agora todos os movimentos dos astros (as estrelas distantes se movem em círculos em torno da Terra também) são descritos pelo seu modelo, que iremos chamar de modelo Ptolomaico (devido ao seu criador, Ptolomeu).



Modelo Ptolomaico: o movimento retrógrado (1a figura) é descrito
como o movimento do planeta (P) circular em torno da Terra (T)
porém com movimentos circulares secundários (2a e 3a figuras).


Note que tudo o que você estudou possui caráter cinemático: em momento algum você menciona o quê causa o movimento, qual a causa física do movimento. Pode ser que uma tartaruga invisível gigante carrega os planetas, ou anjos batem suas asas de modo a mover os astros, ou oompas lumpas puxam os planetas para se movimentarem. Seu estudo se resume a estudar o sistema, sem saber a causa do movimento. Este modelo que acabamos de imaginar3 perdurou por muitos anos, e até certo ponto ela dava resultados totalmente compatíveis com experimentos. Algumas observações posteriores mostraram que o céu não é imutável (o que contradizia seu modelo), como por exemplo aparições de Supernovas4. Além disto, o movimento de Planetas, como o de Marte, e de cometas não possuía ainda total aceitação pelos seus colegas cientistas. Aproximadamente em 1543 depois de Cristo, Copérnico publicou um livro onde ele, pela primeira vez, propunha um sistema centrado no Sol5. Este sistema consegue explicar com exatidão o movimento 'estranho' de Marte. Mas, não tinha ainda nenhuma melhora tão significativa quanto o modelo Ptolomaico. O modelo Copernicano ficou em segundo plano entre os cientistas por muito tempo (tanto pelos anos de 'tradição' do modelo Ptolomaico, quanto pela igreja que achava muito mais justo para Deus que um sistema fosse centrado na Terra, sua maior criação).

Já tínhamos dito que um modelo científico tem que, além de descrever resultados experimentais com certa precisão, prever resultados novos. Note que todos os fenômenos até então existentes eram descritos pelo modelo Ptolomaico, e não era necessário um novo modelo. Entre os séculos XVI e XVII nasceram e viveram vários dos maiores cientistas de todos os tempos. Vou citar alguns, que modificaram drasticamente a maneira como o mundo descrevia a natureza: Tycho Brahe, Johannes Kepler, Galileu Galilei e Isaac Newton.

Galileu Galileu, um dos maiores cientistas de todos os tempos. Inventou um tipo de telescópio mais potente e funcional que os que já existiam e conseguiu observar luas que giravam em torno dos planetas, além de observar que tanto a nossa Lua quanto Marte não são corpos perfeitos, esféricos e lisos. Em especial ele observou que as luas de Júpiter se moviam com um movimento aproximadamente circular em torno do próprio planeta, o que contradizia o modelo Ptolomaico, que dizia que os corpos devem girar em torno da Terra. Defendeu o sistema Copernicano, mas teve que aceitar publicamente, devido a pressões da igreja, que o modelo Heliocêntrico de Copérnico não era necessariamente o comportamento real da Natureza.

Tycho Brahe, além de ser uma pessoa extremamente excêntrica, foi um dos maiores astrônomos experimentais de todos os tempos. Uma pessoa muito metódica e cuidadosa com os experimentos, sendo que suas tabelas podem ser usadas para comparações até os dias de hoje. Mas, nenhum de seus modelos acertavam suas observações.

Johannes Kepler, um excelente cientista e matemático, que tinha fé na perfeição da Natureza. Kepler fez vários modelos matemáticos para descrever um modelo para o movimento dos astros, baseados nas observações de Brahe. Fez tanto modelos geocêntricos quanto modelos heliocêntricos, sendo que um dos modelos mais belos da astronomia se deve a ele (figura abaixo). Com os dados de Tycho Brahe, Kepler chegou à conclusão que os planetas se movem em torno do Sol, em uma órbita que não é circular!!! A órbita dos planetas é uma elipse em torno do Sol!!!


Um dos modelos do sistema Solar proposto por Kepler, antes dele chegar em suas leis:
os planetas se moveriam em torno do Sol em esferas inscritas nos chamados sólidos
perfeitos!!! Como havia apenas 5 sólidos perfeitos e 5 distancias entre os planeta
conhecidos, isto não poderia ser coincidência, segundo Kepler!!!
Um modelo muito bonito, mas não estava de acordo os dados experimentais.


O modelo de Kepler, as conhecidas 3 leis de Kepler, foi aceito por alguns cientistas da época, e criticado por outros. Mas este modelo descrevia com exatidão todos os dados experimentais. E conseguia prever a posição de astros celestes. Mas note que este ainda é um modelo cinemática: NADA foi dito do por que os astros se moverem em elipses em torno do Sol, ou sobre suas velocidades. Agora entra em cena o que, talvez, tenha sido um dos homens que mais tenha mudado o pensamento cientifico em todos os tempos: Isaac Newton (muitos estudantes têm ódio mortal de Newton, por terem que calcular bloquinhos em planos inclinados, leis de força, gravitação, etc. Mas... vamos dar uma 'forcinha' para nosso colega Newton e tentar entender o tanto que ele fez para o bem da humanidade... sem ele não teríamos a tecnologia e o progresso que temos hoje.). Em seu livro PrincípiosMatemáticos da Filosofia Natural6, Newton propõe uma teoria DINAMICA da Natureza, ou seja, ele fala não somente sobre o comportamento dos corpos, mas O QUE CAUSA ESTE MOVIMENTO. Na segunda lei de Newton ( F = ma ) ele diz que um conjunto de forças pode acelerar um objeto. Aceleração implica em mudança na velocidade que implica em mudança de posição, sendo assim, sabendo o conjunto de forças que atuam num corpo podemos saber com exatidão sua velocidade e sua posição no futuro. Esta é a primeira lei dinâmica da física!!!

Newton também propôs um modelo para a força que atrai a Terra em direção ao Sol7. Como dissemos acima, sabendo a força em princípio podemos achar a velocidade e a posição de qualquer objeto em qualquer instante de tempo. As leis de Newton e a lei de força gravitacional, aplicadas a um sistema Copernicano, conseguia deduzir as leis de Kepler, conseguia descrever as observações de Galileu e de Tycho Brahe, além de conseguir prever a órbita de planetas e cometas (por exemplo, Halley, aquele do cometa Halley, era amigo de Newton e um dos principais incentivadores de sua teoria. A previsão do período de 76 anos do cometa Halley foi feita por Newton com exatidão). Uma das maiores conquistas da teoria de Newton foi a descoberta de Netuno: as astrônomos haviam descoberto mais um planeta, Urano, e utilizado a teoria de Newton para 'construir' sua órbita. Porém, as observações experimentais não 'batiam' com a teoria de Newton. Os astrônomos, como possuíam fé na teoria de Newton, afirmaram que deveria existir um planeta, com uma determinada massa, e que se um astrônomo com um telescópio mais potente observasse o céu no dia e na hora prevista pela teoria Newtoniana, este planeta estaria lá. Em 23 de setembro de 1846, astrônomos confirmaram que realmente existia este planeta!!! Uma previsão teórica espetacular, vocês concordam???

A teoria Newtoniana, perdurou por séculos e até hoje é utilizada por vários cientistas para estudar os corpos celestes. É também utilizada para que as agências espaciais coloquem satélites em órbita, ou para enviarem sondas em planetas. É uma teoria linda, com um poder de previsão fantástico. Mas, será que ela é a teoria que melhor descreve o movimento dos corpos celestes? De fato, hoje sabemos que a teoria Newtoniana é um limite especial de uma teoria muito mais complexa e exata para a descrição dos fenômenos celestes, que é a teoria da relatividade geral. Mas isto não desmerece de forma alguma a teoria Newtoniana, que continua sendo utilizada e aplicada em vários setores da ciência.


*Leonardo Antônio de Sousa é doutor em Física e professor da UFV em Florestal/MG. 

Notas:

1 Descrever é muito diferente de explicar, na minha opinião.
2 O movimento de Júpiter e Saturno também não é bem explicado por sua teoria, mas o erro em Marte é mais pronunciado.
3 Desenvolvida por MUITOS filósofos gregos, chineses, mesopotâmicos, egípcios, etc. Dentre eles: Aristóteles, Platão, Aristarco, Ptolomeu, etc.
4 Supernovas são explosões de estrelas com mais de 10 massas do Sol. Podem ficar no céu por semanas ou meses.
5 O livro se chama Sobre as Revoluções das Esferas Celestes. Apesar de ser citado como um livro revolucionário, seu conteúdo é conservador, e o sistema heliocêntrico é citado somente em uma pequena parte do livro.
6Neste livro, além de propor toda a estrutura de uma teoria dinâmica da Natureza, Newton introduz uma teoria matemática totalmente nova: o calculo diferencial e integral. Um livro genial.
7 E Newton foi além, disse que esta força atua entre TODOS OS OBJETOS DO UNIVERSO!!! Pense em quanto esta afirmação é forte!!!

Um comentário:

Luiz Alfredo disse...

Patabéns, muito bom o texto!

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