terça-feira, 22 de novembro de 2011

Modelo para compreender a dinâmica da cultura científica

Por Elton Alisson 
De São Paulo

A dinâmica da cultura científica de países como o Brasil e os ibero-americanos pode ser representada na forma de uma espiral que, acompanhando o desenvolvimento de suas instituições voltadas para a prática e produção da ciência, contribui para visualizar e entender seus traços comuns.

A proposta foi apresentada por Carlos Vogt, professor titular da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em artigo publicado no fim de outubro na revista Public Understanding of Science.

No artigo, Vogt apresenta o conceito da “espiral da cultura científica”, que elaborou enquanto presidiu a FAPESP no período de 2002 a 2007, em que iniciou uma reflexão sobre o papel da divulgação da cultura científica e instituiu em 2003 a Agência FAPESP com o lema “Divulgando a cultura científica”.

Com base nessa reflexão, Vogt esboçou a ideia da espiral da cultura científica e escreveu a primeira versão do texto sobre o conceito, que foi publicado no Boletim de Ideias nº 3, da FAPESP, em dezembro de 2005.

“A ideia era construir uma forma de representação da dinâmica da cultura científica desde o momento da produção do conhecimento científico até a apropriação e a circulação dele pela sociedade em geral, demonstrando como esse processo, que tem características muito particulares, ocorre de forma organizada, com diferentes atores atuando em cada uma de suas fases”, disse Vogt à Agência FAPESP.

Para representar esse movimento contínuo da produção e circulação do conhecimento científico, o pesquisador criou uma espiral que gira sobre dois eixos e quatro quadrantes, que agrupam fatos e acontecimentos institucionais coincidentes no tempo em países como o Brasil e outros da América Latina.

Dispostos sobre o movimento da espiral, esses fatos e acontecimentos possibilitam marcar pontos e delinear traços comuns entre esses países com características econômicas, culturais e sociais similares, além de apontar especificidades em relação ao relacionamento,às atitudes e a compreensão de suas sociedades sobre ciência e tecnologia.

“A espiral da cultura científica pode ser lida como uma grande metáfora que ajuda a compreender o processo de construção do conhecimento e de suas transformações em um determinado espaço geopolítico”, disse.

Na figura da espiral da cultura científica do Brasil e da América Latina que ilustra o artigo, no primeiro quadrante – o da produção e da difusão da ciência, que representa o ponto de partida da espiral – estão relacionados próximos ao período de fundação da FAPESP, em 1962, a criação do Conselho Nacional de Pesquisas Científicas e Técnicas (Conicet, na sigla em espanhol) da Argentina, em 1958, e da Comissão Nacional de Pesquisa Científica e Tecnológica (Conicyt, na sigla em espanhol) do Chile, em 1968.

Já no segundo quadrante, do ensino da ciência e da formação de cientistas, estão listadas como acontecimentos coincidentes em 1999 a criação da revista Pesquisa FAPESP, do Programa José Reis de Incentivo ao Jornalismo Científico (MídiaCiência) da FAPESP e da revista eletrônica ComCiência, do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Unicamp, que Vogt coordena.

Por sua vez, no terceiro quadrante, do ensino para ciência, foram destacadas a criação da Estação Ciência, da Universidade de São Paulo (USP), e do Museu Experimental de Ciências em Rosário, na Argentina, ambos em 1987.

Por fim, no último quadrante, referente ao ensino de ciências e formação de cientistas, são listadas a fundação da USP, em 1934; da Unicamp, em 1966; e da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em 1976.

“Ao evoluir por cada um desses quatro quadrantes, a espiral da cultura científica retorna ao seu ponto de partida de uma forma diferente da original devido, exatamente, à própria dinâmica das transformações pelas quais passa o conhecimento científico”, explicou.

Percepção da ciência

Segundo Vogt, o conceito da espiral da cultural científica pode funcionar como modelo explicativo e descritivo e uma espécie de princípio de classificação e organização da cultura científica de diferentes países, e integra os chamados indicadores culturais de ciência e tecnologia.

Relacionados a estudos sobre a percepção pública da ciência, esses indicadores têm sido levantados em projetos que envolvem diversos países, buscando estabelecer relações entre ciência e sociedade, como, por exemplo, o nível de informação, conhecimento e atitudes de seus cidadãos em relação à ciência e tecnologia.

“Esses indicadores visam identificar traços comuns entre países que têm uma série de características similares, do ponto de vista econômico, cultural e social, e especificidades na questão do relacionamento, das atitudes e da compreensão de suas sociedades em relação aos temas de ciência e tecnologia”, explicou.

Vogt coordenou o estudo sobre indicadores culturais de ciência e tecnologia referentes especificamente ao Estado de São Paulo, intitulado Percepção pública da ciência e da tecnologia no Estado de São Paulo, publicado no capítulo 12 dos Indicadores de Ciência, Tecnologia e Inovação em São Paulo 2010, lançado pela FAPESP em agosto de 2011.

O artigo também introduz o termo bem-estar cultural, segundo Vogt, "um tipo de conforto, além do bem-estar social, que tem a ver com as relações da sociedade com as tecnociências, envolvendo valores e atitudes, hábitos e informação, e que pressupõe uma participação ativamente crítica por parte da sociedade na totalidade das relações".

O artigo The spiral of scientific culture and cultural well-being: Brazil and Ibero-America, de Carlos Vogt, pode ser lido por assinantes da Public Understanding Scienceem http://pus.sagepub.com/content/early/2011/10/21/0963662511420410.

fonte: Agẽncia FAPESP

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