Este texto é parte de um livro chamado "Algumas razões para ser um cientista" publicado no ano de 2005 pelo Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF). É uma coletânea de textos que são fruto de diversas entrevistas feitas com vários cientistas mundialmente conhecidos. Nas entrevistas, os cientistas tinham a missão de responder à pergunta título do livro e em seguida os entrevistadores escreveram textos que sintetizavam a fala dos entrevistados. A parte do livro que fala sobre Jayme Tiomno ficou a cargo de Carolina Cronemberger.
Carolina Cronemberger |
Carolina Cronemberger é doutora em física pelo CBPF e atualmente realiza estágio pós-doutoral em bioinformática na Universidade de Amsterdam na Holanda. Foi responsável por entrevistar Jayme Tiomno neste livro. Talvez a última entrevista de Tiomno em vida. Apaixonada por divulgação científica, realizou diversos trabalhos interessantes, como por exemplo uma série de textos para crianças publicados na revista Ciência Hoje. Cronemberg disponibilizou gentilmente ao fóton Blog o capítulo que fala da vida do grande físico teórico.
Trabalho Duro
Por Carol Cronemberg*
Segundo o professor Jayme Tiomno trabalhar duro e estar pronto para tudo foi o que lhe garantiu tanto sucesso profissional. Nas suas palavras: “É necessário ser agressivo, não no sentido pessoal, mas no sentido de se apresentar disposto a tudo. E procurar o que está fora do que os outros fazem.”. Tiomno trabalhou com 3 prêmios Nobel durante sua carreira: Chen Ning Yang (1957), Eugene Wigner (1963) e
Abdus Salam (1979).
Nascido em 1920 no Rio de Janeiro, Tiomno, após fazer a maior parte da escola secundária em Musambinho, interior mineiro, voltou para o Rio de Janeiro para concluir os estudos e cursar a universidade. Ele conta que em Musambinho teve a possibilidade de estudar com excelentes professores no ensino médio e isso lhe despertou o interesse para as ciências de um modo geral: Física, Matemática e História Natural. Foi tão boa sua formação que, ao ser transferido para completar os últimos anos no colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, já havia cumprido uma parte do programa de ciências anteriormente. Em razão dos seus interesses, decidiu que faria o curso de medicina. Não agradou seus pais, estes achavam que a família não precisa-va de mais um médico, pois seu irmão mais velho já se preparava para isso. Mesmo assim, ingressou na Faculdade de Medicina e, convidado por Carlos Chagas, foi ser bolsista-monitor no seu laboratório.
No fim do primeiro ano sabia que queria fazer ciência; primeiro pensou em Biologia, mas logo se decidiu por Física. No ano que decidiu fazer biologia não foram abertas vagas em Manguinhos, e ele saiu de férias para São Lourenço. Seu irmão, que estava no Rio, conseguiu matriculá-lo no curso de Biologia da Universidade do Distrito Federal (UDF), o que podia ser feito sem exame de matemática.
Tiomno voltou logo ao Rio e resolveu se matricular em Física, que exigia esse exame. Conseguiu que o professor Luis Freire, da UDF, marcasse um exame de matemática extra, fora de época. No dia do exame oral, só havia conseguido estudar metade da matéria a ser cumprida. A primeira pergunta foi feita exatamente sobre a parte que Tiomno não tinha visto. Depois de explicar isso para o examinador, professor Lélio Gama, foi argüido apenas da metade do programa que tinha estudado. Passou com louvor e foi admitido com a promessa de estudar a parte restante.
Tiomno conta que a princípio seu interesse era ser professor secundário e que não imaginava como era o trabalho de pesquisa. Tendo trabalhado durante sua carreira principalmente em teoria, foi a prática de laboratório e o contato com professores e pesquisadores que o motivaram a seguir uma carreira acadêmica, englobando pesquisa, aulas e orientação de estudantes. Conta que só teve contato com a Física Moderna quando foi para São Paulo, depois de formado. Logo depois foi para Princeton, nos EUA, fazer doutorado.
Em Princeton, Tiomno foi trabalhar com John A. Wheeler, um dos grandes nomes da Física. Lá seus colegas diziam que ele era muito exigente com seus alunos. “É isso mesmo que eu quero”, respondia ele. Durante um dos seminários de Wheeler, Tiomno percebeu que podia demonstrar que interações fracas entre quatro partículas diferentes tinham sempre a mesma intensidade. Fez as contas e mostrou ao professor. Iniciaram uma colaboração e esse trabalho, que levou à descoberta da universalidade das interações fracas, recorda Tiomno, foi o mais importante de sua carreira. Da época do seu trabalho com Wheeler, Tiomno conta uma estória engraçada: O ritmo de trabalho era muito acelerado, eles discutiam alguma coisa num dia, no dia seguinte, Tiomno chegava com os cálculos feitos. Wheeler, que era muito cioso das contas, refazia quase todas. Tiomno ficou sabendo por amigos, algum tempo depois, que Wheeler ficou surpreso com aquele aluno e dizia que nunca trabalhou tão duro.
Já de volta ao Brasil, Jayme Tiomno casou-se com a física Elisa Frota- Pessôa, com quem havia trabalhado nos tempos de faculdade. Continuou colaborando com universidades de todo o mundo e ajudou a criar diversas instituições científicas no Brasil e fora do país. Foi um dos fundadores do Instituto de Física da Universidade de Brasília, um projeto pioneiro que não resistiu às arbitrariedades comuns nos anos do regime militar no Brasil. Essa é uma das poucas decepções que o professor Tiomno teve com a Física. Seus desconfortos, quando existentes, eram mais de origem humana que profissional. Não é qualquer pessoa que fala com tanta calma e tranqüilidade sobre sua carreira. O segredo , nos seus trabalhos ou nas conquistas políticas desta geração, fica evidente quando ele diz: “tínhamos a convicção de que íamos chegar lá”.
*Carol Cronemberger é física e faz pós-doutorado em bioinformática na Universidade de Amsterdam na Holanda.
Um comentário:
É bem chamativo, deu pra pensar no assunto, mais vo segui com a engenharia. (e os arquivos da eletrotécnica genipapo, processador)
Postar um comentário