Em 1946, aos 22 anos, o físico brasileiro César Lattes chegou à Inglaterra para uma temporada no Laboratório H.H. Wills, na Universidade de Bristol. Lá, uma equipe liderada pelo físico Cecil Powell empregava emulsões nucleares – chapas fotográficas especiais – para tentar capturar fragmentos da matéria produzidos a dezenas de quilômetros de altitude pelo choque de raios cósmicos contra núcleos atômicos.
Lattes era jovem, mas tinha uma boa formação teórica e experiência na análise de chapas fotográficas, adquirida em um treinamento dado pelo físico italiano Giuseppe Occhialini, que passou uma temporada no Brasil e, naquele ano, estava trabalhando em Bristol na Inglaterra.
Ao chegar no laboratório britânico, uma das primeiras incumbências de Lattes foi calibrar as emulsões. Entre as chapas calibradas, estavam algumas nas quais, a pedido de Lattes, foi acrescentado bórax (tetraborato de sódio) na composição. Ele solicitou então a Occhialini, que estava indo esquiar nos Pirineus franceses, que expusesse emulsões normais e carregadas com bórax no observatório astronômico no Pic-du-Midi, a 2,8 mil metros de altitude.
Ao revelar as emulsões com bórax, Occhialini notou evidências de mésons sendo capturados por núcleos e os desintegrando. Virou a noite, escreveu um artigo e o enviou para publicação –assinado apenas por ele e Powell.
Pouco depois, a equipe de Bristol identificou os primeiros exemplos do decaimento de um píon em um múon. Esse trabalho foi relatado na Nature e assinado, nesta ordem, por: Lattes, Muirhead, Occhialini e Powell.
Lattes percebeu a importância da exposição das novas emulsões em grandes altitudes e pediu a Powell que financiasse sua ida ao monte Chacaltaya, na Bolívia, com cerca de 5,3 mil metros de altitude, para novas experiências.
Dessa vez, as emulsões revelaram 31 trajetórias com decaimentos de píons em múons. Os resultados foram publicados em artigos assinados por Lattes, Occhialini e Powell, na Nature e na Proceedings of the Physical Society of London, com grande impacto internacional. A descoberta do que passou a ser conhecido como méson pi explicava por que o núcleo dos átomos é estável - em outras palavras, por que os prótons, que têm carga positiva, não se repelem, explodindo o núcleo.
No início de 1948, Lattes foi trabalhar em Berkeley, Califórnia, onde funcionava o síncrotron de 182 polegadas, cujo principal objetivo era a produção artificial de píons – até então, não detectados, para a profunda insatisfação do líder da equipe, Eugene Gardner.
A chegada de Lattes representou muito mais do que a simples ida de um colaborador. Ele era o portador das técnicas desenvolvidas pelo grupo de Bristol e apostou que píons poderiam ser produzidos no acelerador de Berkeley. Estava certo.
Suas primeiras iniciativas foram aumentar o tempo de permanência das emulsões no revelador e retirar o excesso de papel preto que as envolvia. Uma semana depois de sua chegada, os primeiros píons apareceram. Esses resultados foram publicados na Science.
O nome de Lattes estará para sempre vinculado às detecções do méson pi. Mas ele foi além disso. Na década de 1960, descobriu fenômenos relacionados à produção múltipla de mésons; estabeleceu laboratórios no Brasil e no exterior e concretizou uma colaboração intensa e duradoura com o Japão, na área de raios cósmicos. Envolveu-se ainda com estudos teóricos.
Para conhecer melhor a trajetória de Lattes, leia o artigo “Lattes: Nosso Herói da Era Nuclear”, Física na Escola, v.6, n.2, do jornalista Cássio Leite Vieira.
fonte: Física na Escole a Pion blog de Física
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